sexta-feira, 19 de maio de 2017

Opinião (BD) - Aprocryphus (volume um)

Capa do 1.º volume da autoria de Carlos Amaral


Aprocryphus é um projecto de BD de autores para leitores, sem filtros ou intermediários. Portanto quem comprar este livro está a apoiar directamente os autores. Isto não é propriamente algo novo. Com a facilidade de comunicação e visibilidade que a Internet, mas em especial as redes sociais, trouxeram, cada vez mais vemos autores a tentar a sua sorte sem terem de passar pelo "crivo" de uma editora convencional. Esta oportunidade de "ultrapassar" o selo de aprovação de uma editora significa que temos ao nosso alcance tudo, desde o pior que podemos imaginar passando por projectos que dada a sua especificidade nunca seria rentáveis para uma editora dita convencional, projectos como este, mas falemos dele.

Neste primeiro volume, e tenho a certeza que todos serão assim nem que seja pela natureza intrínseca do projecto, o que salta mais à vista, metafórica e literalmente falando, é o quanto ele é ecléctico, seja nos argumentos, seja na arte e isto apesar de "preso" a um tema, que neste primeiro volume é a Fantasia. São seis histórias, embora a ultima seja claramente de Ficção Científica, que muito me agradaram. Vamos poder apreciar histórias com inspiração na mitologia Árabe, seguida de outra que mistura quase todas as mitologia, desde a Cristã passando pela Grega, Hindu ou Egípcia, ou ainda uma que tem forte parecença (pelo menos assim me pareceu) com Conan o Bárbaro e muito humor, mas apenas para quem o souber ver.

Enfim tenho a certeza que  os apreciadores de BD irão encontrar pelo menos uma história que lhes aguarde. No meu caso foram seis em seis.

Este primeiro volume teve a mão dos seguintes autores: Nuno Amaral Jorge, Inocência Dias, Mariana Flores (Maria Mar), Rui Gamito, Miguel Jorge, Miguel Montenegro, Phermad (Fernando Madeira), Pedro Potier, João Raz, Pedro Daniel (Phobos Anomaly Design) e com uma belíssima capa da autoria do Carlos Amaral que também tem neste volume uma entrevista realizada pelo Nuno Amaral Jorge.

Este é um projecto que, para já, tem uma periodicidade anual sendo que se tudo correr bem e eu espero que sim, lá para o final deste ano teremos o segundo volume.

Para saberem mais sobre este projecto ou mesmo para adquirirem um exemplar, caso não tenham a sorte de os encontrarem em algum encontro de aficionados de BD, podem visitar o site do projecto em:

http://apocryphusproject.com

terça-feira, 9 de maio de 2017

Novos Talentos da Literatura Portuguesa? Quem e Onde?

Quem são os novos talentos da Literatura Portuguesa? A revista Estante, colocou esta mesma questão a "alguns dos mais consolidados autores da nossa praça" incluindo o "nosso" Luís Filipe Silva.

Confesso que algumas respostas me desiludiram. Parece-me que em alguns casos nem chegaram a ler a pergunta, ou então aproveitaram para fazer publicidade, ou isso ou eu tenho uma concepção de novos talentos (muito) diferente. Querem um exemplo? Mário Zambujal, autor da "Crónica dos Bons Malandros" dá como exemplo o  Gonçalo M. Tavares. Ora estamos a falar de um autor que já publica (e arrecada prémios) desde dois mil e um e que não tarda nada está a atingir a marca das quatro dezenas de livros publicados (a solo). E um dos dois nomes que o Luís Filipe Silva menciona é o do António de Macedo que já publica Ficção (para não ir mais longe) desde mil novecentos e noventa e dois. Repare-se que não está em causa a qualidade e o mérito dos autores, mas dificilmente os apelidaria de novos talentos.

Isto fez-me pensar quem são e onde estão afinal os novos valores da Literatura Portuguesa, mais concretamente os de Ficção Científica e Fantasia. Para melhor compreendermos quem podem ser estes novos talentos o melhor será começar por definir o que é afinal um novo talento. Vou balizar como novos talentos, os autores que independentemente da sua idade e meio de publicação (digital ou papel em edição de autor ou em editoras convencionais) começaram a publicar já durante esta década, portanto a partir de dois mil e onze. Naturalmente esta minha definição também poderá ser alvo de critica, mas não se pode agradar a "gregos e troianos".

A primeira conclusão a que chego é que se os queremos encontrar, dificilmente o vamos fazer nos catálogos das editoras tradicionais e/ou nas livrarias convencionais. Que novos nomes vemos nos escaparates? Poucos, muito poucos. E porquê? Não tenho a presunção de conhecer (todas) as nuances que pautuam o mercado editorial Português, mas olhando para o que por cá se vai publicando torna-se claro que é (muito) mais fácil ver publicado um estreante autor estrangeiro, quase invariavelmente de um pais de língua anglófona, do que um autor Português. E porque é que isso acontece? Mesmo sendo novo, um autor estrangeiro já traz consigo (quase) todo o marketing feito, desde prémios (pseudo)importantes a frases feitas elogiando a obra e/ou o autor de outros autores e/ou sites de livros passando por algum (possível) contrato para adaptar o livro ao cinema ou à televisão. Enfim como se costuma dizer na gíria popular: traz toda a "papinha" feita. Mesmo se juntarmos os custos da tradução e, claro, os direitos de publicação, que tanto quanto sei não são propriamente baixos, as editoras (parecem) continuar a preferir os autores estrangeiros.

Um livro de um novo autor Português, exclua-se as figuras públicas que são um caso à parte, tem de ser editado (não confundir com publicado), tem de ser publicitado, tem, ou deverá ter uma estratégia de marketing, que passa por exemplo, comprar espaço nas prateleiras das livrarias e grandes superfícies e tudo isto custa dinheiro e sem nunca se ter a certeza (pequena ou grande) de que o autor irá ter sucesso. Repare-se que a qualidade do autor não é para aqui chamada.

Mas então não existem Portugueses a escrever? Não há quem escreva Ficção Científica e Fantasia na língua de Camões? A resposta a ambas as perguntas é um rotundo sim. Lembro que na segunda edição do prémio Bang! da editora Saída de Emergência, e segundo números da mesma, a participação de autores portugueses passou a barreira dos cem manuscritos. Mesmo se aplicarmos a Lei de Sturgeon que diz que "90% de qualquer coisa é lixo" ainda ficamos com dez livros/autores bons para publicar. Então onde estão eles? Um boa pergunta para colocar à editora.

Então onde estão estes autores Portugueses? Incapazes (impedidos?) de editarem as suas obras pelas editoras convencionais viraram-se para as muitas plataformas de auto-edição, ou que tenham essa vertente, existentes por esse Internet fora, como  a Amazon, Smaswords, Kobo, Wattpad e tantas outras e por lá vão tendo mais ou menos sucesso em muito graças ao "passa a palavra" nas redes sociais como o Facebook.

As editoras convencionais são agentes passivos e em conformidade com essa imagem e apesar de algumas mudanças (rápidas) a que o mercado tem assistido elas continuam fechadas nas suas torres de marfim à espera que os autores e os seus manuscritos peregrinem até si, ao invés de tomarem uma posição mais pro-activa, procurarem o que de melhor se escreve por ai e oferecerem a possibilidade a esses autores e livros de conquistarem novos públicos. E, felizmente, não falta autores, desde o inevitável Manuel Alves passando pelo Joel G. Gomes, pela Carina Portugal ou pelo Pedro Cipriano, (mas existem muitos mais felizmente). São autores que já deram provas da sua qualidade e de que são (ou serão capazes) de voos mais altos. E já agora uma pequena nota para os projectos onde novos autores dão os primeiros passos como o excelente exemplo que é o Fantasy & Co, entre outros.

A minha visão é a de que esta situação beneficiaria todos os envolvidos. Os autores ganhariam  um parceiro de peso nas editoras que além de disponibilizarem os seus manuscritos a um publico mais vasto (ao invés dos "suspeitos do costume"), ainda teriam um parceiro profissional na preparação dos seus textos, seja na edição, paginação, capas ou marketing. As editoras ganhariam um elemento diferenciador ao apostarem em autores portugueses pois ao editarem um autor estrangeiro podem estar a perder leitores/clientes que preferem ler em inglês, mas este é um assunto que terá direito a um texto próprio.

Com tudo isto não quero dizer que as editoras não queiram novos autores portugueses, até porque do lado do autores também existem muitos que, por variadas razões, preferem não ser editados por uma editora convencional optando pelas soluções acima referidas

Já tinha aflorado este assunto no texto "Manuel Alves – O escritor 2.0" (já nos idos de dois mil e catorze) e irei voltar a escrever sobre estas questões outra vez, pois considero-as da máxima importância para um saudável mercado literário.