segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

A Livraria, A Misoginia e A Censura




 











UM ERRO DE CASTING

Por vezes, acontece.

No fim de dezembro, "A Menina dos Doces" foi o livro mais votado para lermos em conjunto em janeiro.

Porém, o livro revelou-se não ser digno do Clube Good Books. Após leituras tão relevantes para o século XXI, como "Inferior" de Angela Saini e "Rapariga, Mulher, Outra" de Bernardine Evaristo, a linguagem misógina não é tolerada no Clube da Livraria.

Não existem "dramas femininos". Um relacionamento passivo-agressivo não é saudável. O peer pressure é tóxico.

A Livraria Good Books não tolera esta linguagem nem comportamentos deste género das personagens quando não têm o objetivo de serem abordados com respeito e seriedade.

Lamento profundamente o erro de casting. Creio que não minto quando digo que todos nós estávamos a torcer por mais um livro 100% português, especialmente numa época em que vemos pouca diversidade nacional nos nossos livros.

A Livraria Good Books tem como objetivo dar a conhecer livros e autores que passariam despercebidos e proporcionar uma boa experiência de leitura. Sendo uma livraria independente, há essa liberdade na escolha do catálogo.

Podia não ter mencionado o assunto e fingido esquecer o assunto, mas vivemos na era em que estes comportamentos desiguais, machistas e tóxicos não são tolerados.

Fica a mensagem: a Livraria Good Books está atenta e não compactua com tais livros.

"A Menina dos Doces" será retirado do catálogo no fim do mês e não será possível fazer encomendas futuras deste livro na Livraria Good Books.


Cada um tem direito à sua opinião. Este é um dos pilares da nossa sociedade. Não é porque a maioria gosta de Harry Potter, Star Wars ou outro qualquer livro, filme ou o que seja que reúna um consenso alargado que todos temos de gostar e isso é perfeitamente normal. Eu não sou excepção, são vários os livros, por exemplo, que agradam a uma maioria, mas que eu não gosto e vivo bem com isso e espero que a minha posição seja respeitada tal como respeito a dos outros. E se alguma vez, como já aconteceu, discutir as diferenças de opinião com alguém é com prazer que o faço, dentro do civismo que naturalmente se espera, e as vezes lá convencemos ou somos convencidos, mas isso só acontece quando estamos dispostos a ouvir o outro lado e claro a argumentar e fundamentar de modo serio as nossas opiniões.

O problema não é ter uma opinião diferente, o problema é acusar alguém de misoginia e não fundamentar essa acusação. Uma acusação que eu considero extremamente grave, e pior nem querer ouvir o outro lado, mas foi isso que aconteceu.


As acusações foram feitas na página de Instagram da Livraria Good Books e o texto é o que se pode ler acima. Li o livro antes (podem ler aqui a minha opinião) e discuti a questão com a minha esposa (que tinha lido o livro primeiro que eu) e a conclusão foi a mesma: onde estava a "linguagem misógina"? Eu não a vi e a minha esposa também não, assim como outras pessoas que já vieram manifestar a sua discordância desta acusação já para não falar das quatorze mulheres que foram leitoras beta do livro e a sua editora, a Raquel Vicente. Está acusação não só é muito grave como pode destruir a vida de uma pessoa e não pode ser feita modo leviano.


Mas onde está a fundamentação para tão grave acusação? O texto, que assumo foi escrito pela Ana Teresa Barreiros, a CEO da Livraria Good Books, tem muitas verdades com as quais concordo em abstrato, mas quando tento ligar o que escreve com o livro e o autor falho em ver as ligações.

Dizer que "Não existem "dramas femininos". Um relacionamento passivo-agressivo não é saudável. O peer pressure é tóxico." é muito bonito, mas onde é que isso aparece no livro e/ou em que contexto? E como é que isso é misoginia? A Ana Teresa Barreiros não explica...


"A Livraria Good Books não tolera esta linguagem nem comportamentos deste género das personagens quando não têm o objetivo de serem abordados com respeito e seriedade." Novamente é muito bonito, mas não é verdade. O autor aborda estas questões com muito seriedade, abordando assuntos difíceis com tacto e respeito.


"Podia não ter mencionado o assunto e fingido esquecer o assunto, mas vivemos na era em que estes comportamentos desiguais, machistas e tóxicos não são tolerados." E ainda bem que não serão tolerados, mas "A Menina dos Doces" não faz parte desses comportamentos, muito pelo contrario. O autor criou personagens femininas que apesar das vicissitudes da vida, dos erros tem a força para fazer o que é certo no final e outra que nos mostra o que pode acontecer quando nada fazemos. São personagens humanas com falhas como todos nós. Não sei onde estão os comportamentos machistas e tóxicos. Se alguma coisa vejo é precisamente oposto do que a Ana Teresa Barreiros afirma.


As acusações são por si só já muito graves, mas juntar a isso a censura... Quem respeitosamente discordou e se deu ao trabalho de escrever um comentário teve como recompensa ser bloqueada e o comentário apagado. Este comportamento é sempre algo que vejo com desconfiança, porque é algo que não faria. Pergunto-me o porquê desta autentica campanha de difamação e censura. O que é que leva uma pessoa a, contra todas as evidencias, afirmar o seu oposto? 


Por fim gostaria de dizer que escrevo este texto não porque conheça o Pedro, mas porque li o livro e li as acusações extremamente graves feitas e não encontrei base para elas. E acho que é nosso dever denunciar também estes "erros de casting". 

Espero que a Ana Teresa Barreiros ou fundamente devidamente a acusação que faz ou que se retrate de tão vil acusação. Se não o fizer receio que muito em breve possa existir outra incauta vitima...


PS: espero que a Raquel Vicente não se importe de lhe ter roubado o título. 

3 comentários:

  1. Respostas
    1. Não é isso que eu pretendo com este texto, não o escrevi para que se fizesse boicote à Livraria. A ideia é em primeiro lugar compreender os fundamentos da acusação e contra-argumentar. Infelizmente ainda não vi fundamentos para a acusação que foi feita.

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  2. Eu entendo que não tenha sido essa a intenção. No entanto, é uma conclusão a que muitos, eu incluído, poderão chegar face à situação que é descrita. Rejeitar a colocação de um livro na sua loja é algo que qualquer livreiro pode fazer. Seja por não gostar do autor, por não se adequar ao público da sua livraria, ou por não ser comercialmente viável, cada um terá os seus argumentos. Ainda não li o livro do Pedro para saber se concordo ou não com o que é dito. De qualquer forma, não me parece que banir um livro da estante devido a uma questão de interpretação da narrativa (bem ou mal) tenha sido a melhor decisão.

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